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The Oz:

Um sonhador lúcido por natureza, eu caminho pelas ruas em constante devaneio. Olho a vida ao meu redor com os olhos de Will Eisner e a sensibilidade das histórias de Neil Gaiman. Alguém já me disse que sou o último dos românticos. De alma transparente, de coração ingênuo, calado e meio ermitão, talvez um dia eu me torne uma daquelas figuras mitológicas que dizem andar pelas ruas das cidades cinzas, mas que ninguém nunca viu. No fundo sou só um cara normal, com Orkut e amigos pseudo-malucos. Nada demais. No fundo, somos todos normais, mesmo com a esquisitice em moda.


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Echo

sexta-feira, 30 de abril de 2010

O Mundo de Oz - Tomo II: Delirium - Cap. 5

.delirium

Capítulo 5: Rush (The Living Dead)

Corri tudo que pude por aqueles corredores sombrios, até chegar a um beco sem saída. Podia ouvir os latidos de longe. Podia ouvi-los aumentando e sentir a aproximação do fim. De repente, vejo os olhos vermelhos de um deles. E também seus dentes rangendo. Então, apareceu outro. E mais outro e mais outro. Quatro cachorros ferozes que mais pareciam lobos selvagens sedentos por sangue. Queria acordar. Precisava acordar daquele pesadelo! E acordei, bem na hora em que me tornaria comida canina. Eu estava ofegante como sempre após um pesadelo. Lembrei-me de uma vez jogando RPG, quando o mestre fez com que um mago rival me pusesse um feitiço eterno no qual eu nunca poderia me aproximar de um cachorro ou lobo, ou enlouqueceria.

O anjo caído entrou e caminhou com certa sobriedade e arrogância pelo quarto de Damien, vislumbrando a cena do filho adormecido entre mulheres nuas e demônios. Só fez barulho quando quis que seu filho acordasse. E assim o fez irritando um dos cachorros deitados num dos tapetes. Damien despertou, nada surpreso.
- Acorde. – disse a Estrela da Manhã.
- O que é tão urgente?
- O medalhão de Agat. Vim buscá-lo. Cora está diante de meu trono à espera dele.
- Mas... – agora, Damien parecia surpreso.
- Filho... – disse Lúcifer, pegando o medalhão sobre uma mesa – Você tem que entender que, se Ele entregou seu filho para morrer para contar uma história, porque eu não mataria o meu por uma?
E antes que Damien levantasse da cama, um breve olhar do anjo negro para o cachorro fez com que uma raiva incontrolável despertasse dentro do animal, que pulou sobre o Damien, estraçalhando sua carne até que não mais se movesse. Os seres nus continuavam adormecidos e os demônios sorriam, enquanto o enorme cachorro tomava forma humana.
- Vou usá-lo agora. – disse Lúcifer olhando para o medalhão – e ele voltará para suas mãos depois da tarefa de Mabi. Para que cumpra seu papel no passado, Sith.
- Que assim seja, milórde – disse o homem de olhos vermelhos que outrora era um cão.

Eu sabia que aquele não era um sonho comum. Algo naquele lugar parecia irreal, mas também havia algo de mitológico, mágico. Ainda mais com a bela garota pálida com suas vestes e cabelos pretos. Achei que estava num belo sonho e que iria me dar bem. Ledo engano.
- Esta rocha, com estas inscrições, representa Mabi, a Rainha das Nixies, das fadas. A Ilusão. – disse ela para mim. – E aquela rocha lá embaixo, na pequena ilha, é você.
- Eu? Nem sei que lugar é esse.
- O Limbo. O lugar onde você cria seus mundos, suas histórias... – ela disse.
- Se tudo isso aqui é fruto da minha cabeça, como você sabe mais sobre tudo isso do que eu? Eu não faço idéia do que você está falando... – eu disse.
- Não esquente, Sétimo Oz. Vai se lembrar em breve. – disse Cora, com ar cabisbaixo.
Então, eu ouvi algo e senti o ar se contorcer, mas sem ventar. Olhei para cima, à minha esquerda, e tive uma visão que não se vê todos os dias: uma loira vestida de branco surgiu do nada, como um fantasma e “pousou” no gramado. Tudo que consegui fazer foi prestar atenção no diálogo entre ela e Cora.
- Ora, se não é o brinquedo de Hades. Como chegou aqui, arremedo de personificação antropomórfica. – disse a loira.
- Guarde seus insultos pra você, Mabi. O Escuro e o Mal sabem que estou aqui, pois foram eles que me deram o medalhão de Agat para voltar pra cá.
A loira riu alto.
- Hahaha. Queridinha, o que a faz pensar que eles a ajudaram, se eles têm interesse no Mago Morto tanto quanto eu?
Cora sorriu de leve.
- E você acha que já não sei de tudo isso? Vim cumprir a função que o criador de Oz me designou. Já sei o que me espera.
Mabi ficou séria.
Eu ainda não sabia o que fazer ou dizer.

Chegou em casa desolado e deprimido como sempre. Estava odiando o trabalho, tanto quanto o fato que tanto tempo havia passado e ainda não sabia ao certo o que queria da vida ou não tinha coragem de assumir sua vocação. Ainda mais agora, com um segundo filho a caminho. Sentiu-se solitário, como em muitas outras noites e teve um desejo intenso de morrer. Como em outras noites. Sentia-se pequeno, sozinho e fraco diante da vida. Fechou-se em seu quarto mais uma vez. Fechou-se em si mesmo e em seu mundo particular mais uma vez. Morreu, mais uma vez. Era a oitava.

Eu caminhava pelo Salão das Memórias, à sua espera. Olhava para cada um dos dez espelhos. Parei diante do nono deles.
- Ótimo. Ele está aqui. Arlequim! – gritei. E o palhaço veio.
- Sim, milórde.
- Vá buscar o Nono Oz. Ele está no cemitério, sobre os dez túmulos. Traga-o aqui.

Mabi fez uns sinais com a mão e o chão começou a criar vida. A terra e as raízes cresceram e subiram pelo corpo de Cora, imobilizando-a. Eu parecia paralisado também. Provavelmente deveria estar dormindo sobre os braços, o que normalmente nos faz ficar imóveis nos sonhos. Apenas achei isso naquela hora.
- Oz! Você tem que fazer alguma coisa! – Cora gritou.
- Eu. Eu não sei... – foi tudo que pude dizer.
- Ele não tem o que fazer aqui, senão olhar o amor de seus sonhos morrer, queridinha. Hehe. – disse Mabi.
- Do... Do que você se lembra, Oz? – esforçou-se Cora para perguntar.
Então eu disse aquilo que achei que nunca diria num sonho:
- Eu... Só consigo lembrar que “pior do que tentar encontrar o amor perfeito em vida, é amar um personagem criado em minha cabeça e que não existe de verdade”.
Não sei porque disse aquilo. Mas Cora e Mabi sabiam. E Cora chorou, enquanto Mabi tirava de algum lugar um enorme espelho que brilhava muito.
- Eu disse, garota. Não há o que um ser mitológico como você possa fazer para salvar um criador alienado. No fim – disse a loira, deixando o caminho livre diante do espelho – tudo não passa de ilusão. Loucura. E disso eu entendo.
Eu tive vontade de chorar. Cora então disse suas últimas palavras para mim.
- Oz, toda história pode ser recontada, reescrita. Eu estou cumprindo meu papel, mas e você? Está cumprindo o seu? - uma lágrima de sangue escorreu de seu olho esquerdo. – Quando eu não estiver mais aqui, vire as costas para o que ficou e caminhe numa nova direção. Veja-se no espelho. Pode parecer absurdo, mas eu te...
E antes que ela terminasse, do espelho brilhante pulou um lobo sanguinário que a fez calar. Ele estraçalhou seu pescoço e pareceu deliciar-se com a morte da bela Cora. Eu estava petrificado, com um medo apavorante daquele canino de olhos vermelhos e fumegantes. O lobo arrancou o colar de Cora com os dentes e saiu andando em direção ao espelho, enquanto todo o sangue e todo o corpo de Cora tornaram-se pó e desapareceram, na primeira brisa que passou. Depois que o lobo se foi, eu consegui me mexer.
- Não achei que seria tão fácil te dominar, pequeno Oz. – disse Mabi. – Você é pura ilusão. Lúcifer estava enganado sobre você...
Pensei que talvez o que Cora havia dito fosse mais literal que metafórico, então me virei de costas para onde ela estava e caminhei até o espelho. Olhei para ele e não me lembro do que vi, mas lembro de sentir-se “revelado”, como alguém que recebe do nada uma grande doze de sabedoria. Lembrei de como havia ficado triste antes de dormir por causa da minha vida, da minha preocupação com a chegada de meu primeiro filho e minha dificuldade em amadurecer para ser um bom pai. Lembrei que senti como se tivesse morrido por dentro e então, eu já era mais do que eu, ali, naquele momento onírico.
- “Ah, doce irmã da dor. Sempre sozinha. Cega você procura pela verdade. Eu me vejo em você. vidas paralelas girando na velocidade da luz pelo tempo.” – eu disse para Mabi.
Ela pareceu surpresa, mas manteve a postura arrogante de sempre.
- Ora, ora. – disse a loira. – Finalmente nosso morto-vivo, “o” Oz de verdade.

O palhaço trouxe o Nono Oz. Era eu. Mas ao mesmo tempo não era.
- Venha. – eu disse. – tenho que lhe dar algumas instruções antes de sua última morte.
- Mas... – disse o nono morto, perplexo. Quem é você? Eu morri? Tô sonhando?
- Eu sou você. Ou melhor, você é uma parte de mim que não existe mais. Reparou como somos parecidos?
E, levando-o ao espelho, ele pode ver como éramos a mesma pessoa.



...é, ainda continua...

postado por The Oz às 03:09 |