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The Oz:

Um sonhador lúcido por natureza, eu caminho pelas ruas em constante devaneio. Olho a vida ao meu redor com os olhos de Will Eisner e a sensibilidade das histórias de Neil Gaiman. Alguém já me disse que sou o último dos românticos. De alma transparente, de coração ingênuo, calado e meio ermitão, talvez um dia eu me torne uma daquelas figuras mitológicas que dizem andar pelas ruas das cidades cinzas, mas que ninguém nunca viu. No fundo sou só um cara normal, com Orkut e amigos pseudo-malucos. Nada demais. No fundo, somos todos normais, mesmo com a esquisitice em moda.


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Echo

quinta-feira, 15 de julho de 2010

O Mundo de Oz - Tomo III: Dunkelheit - Cáp. 2 de 4

DUNKELHEIT
O Último dos Livros de Oz

Capítulo 2: 10.000 Days

“Listen to the tales and romanticise

How we follow the path of the hero
Boast about the day when the rivers overrun
How we rised to the height of our halo

Listen to the tales as we all rationalise
Our way into the arms of the savior
Fading all the trials and the tribulations
None of us have actually been there”

Sentado em minha cama, olhando para a TV desligada, ouvindo o som envolvente das músicas no mp3 player, que penetram meus ouvidos e minha mente, eu penso em tudo o que foi e o que eu imaginei que foi. Todas minhas vidas e minhas mortes. Tudo o que eu quis acreditar ser verdade. Ou não.

Eu tinha uns seis anos de idade. Primeiro ano na escola. Mais interessante que as aulas e os outros amiguinhos, era viajar dentro de mim mesmo, imaginando mundos e histórias. Eu tinha uns seis anos de idade. Num sonho, vi um deserto – deveria ter visto uma foto ou um filme, nunca tinha ido num deserto – só areia e nenhum barulho, nem cheiro, nem nada. Afinal, era um sonho. Talvez eu a tenha criado ou ela tenha aparecido, não sei. Mas algo parecido com um dragão vermelho apareceu no meio do deserto e se transformou numa moça. Parecia uma espécie de deusa, sei lá. Ela me disse que aquele deserto era um bom lugar para eu construir meu palácio e meu mundo. Eu comecei a imaginar várias histórias depois disso. Era melhor ficar em meu quarto, imaginando histórias com meus brinquedos velhos, imaginar que um trem poderia ser um robô alienígina e não um trem. Eu gostava. Eu tinha só seis anos de idade. Mas isso incomodava algumas pessoas, eu era avoado, e era castigado por isso. Depois de uma surra tudo que conseguiram foi me deixar ainda mais fechado em meu mundo. Eu senti uma parte minha morrer. Foi minha primeira morte. Eu tinha uns sete anos, então.
Lembro de ter sonhado com um estranho cemitério em meio à neblina e ser guiado por uma garotinha pálida de cabelos pretos. Não lembro se foi naquela época (o sonho), se foi depois ou se foi tudo minha imaginação...

O acidente de carro me fez ficar em casa por uma semana. Minha mãe ainda em uma cadeira de rodas até que sua bacia se colasse novamente (ou algo parecido), meu pai correndo atrás dos responsáveis por transformar o Fusca em ferro-velho e tudo o que eu tinha era meu mundo de sonho. Acho que eu tinha uns 9 anos. Ele ainda não tinha forma definida. Era um deserto cheio de personagens e histórias que mudavam com cada vento que soprava. Ainda fechado, eu sofria nas mãos dos valentões da escola. Um gordinho a quem chamavam de “Repolho” implicava comigo vez após vez. Minha perna ainda doía, minha mãe ainda estava se recuperando e ele ainda me enchia. Tudo que Repolho conseguiu foi uma cadeirada nas costas – literalmente – e fazer parte de uma história que veio em minha cabeça mais tarde. Umas aventuras de eu mesmo com outro nome. Tudo que eu consegui foi ter mais e mais problemas para fazer amigos. Quieto e tímido, me fechei e me fechei em meu mundo de sonho, até o dia que quis morrer por ser tão diferente e me sentir sozinho. Eu tinha uns 12 anos. Foi minha segunda morte. Foi quando sonhei com um gato branco engraçado que me serviu de mestre. Acho.

Rebelde, como todo adolescente, eu tentava deixar o cabelo crescer novamente. A camiseta de bandas de heavy metal, o jeans rasgado e o aspecto meio sujo afastavam mais as pessoas. Hoje não é mais assim. Hoje é legal ter esse aspecto. Naquela época não. Mas eu não ligava. Desde os 14 anos eu passei a viver em meu próprio mundo e o punha numa guerra contra o mundo que estava sendo imposto a mim. Meus sonhos viravam letras de música e histórias difusas e perdidas. Meu mundo não tinha rumo. Nem eu. Naquela noite, depois de tanto brigar com todos e questionar-me se realmente valia a pena lutar por um mundo de sonhos, eu quis morrer. De verdade. Tinha uns 19 anos e queria muito morrer. E morri. Pela terceira vez. Meu corpo acordou depois de uma noite de remédios, bebedeira, vexames que minha memória preferiu não gravar e minha falha em não viver mais. Uma longa caminhada até em casa me fez desabar na cama e sonhar com uma gótica tentando me salvar e um enorme corvo me pegando e me jogando dentro de um poço. Minha cabeça tentava agüentar a ressaca e minha mente brincava comigo com personagens de Edgar Allan Poe...

O amor é uma ilusão. Talvez seu eu soubesse disso antes, não teria caído nos sonhos que aquela garota loira vestida de branco criou para mim em meus próprios sonhos. Deixar seu mundo sem rumo, sem tomar conta dele, dá oportunidade para seres como àquela que eu descobri ser a própria Ilusão, entrarem e fazerem dele ainda mais uma bagunça. Afinal, eu tinha 21 anos e estava apaixonado. Meu amor acabaria tornando-se uma princesa em minhas histórias, numa teimosia em manter algo que não mais existia. Claro que depois eu tentaria mudar isso. Quando fui expulso de casa e fui parar numa pensão caindo aos pedaços, cheia de pessoas de origem e intenções duvidosas, meu amor começou a ruir. Meu coração se entristeceu por ter abandonado meu mundo de sonhos. Senti-me muito mal por vender meus sonhos e minha alma ao amor e deitei naquele quarto só com uma cama e nada mais olhando para o teto e querendo morrer. Foi minha quarta morte. Eu tinha 22 anos.

Eu tinha 24 anos quando as torres gêmeas caíram. Eu tentava voltar a assumir meu mundo e me entender com aqueles que eu amava. A Ilusão me ajudou a criar mais e mais coisas para preencher meu mundo. A cada sonho eu viajava para mais longe e vivia histórias cada vez mais fantásticas. Eu tentava voltar a ser criança. Eu me enganei assim por mais de ano, até minha fatídica quinta morte, aos 25 anos e pouco, quando, sem trabalho e vagando pelos trens da cidade que eu rebatizaria de Hell City, eu tive um momento de sobriedade e me vi numa vida miserável e sem sentido. Foi quando comecei a ter mais sonhos metafísicos, numa tentativa de forças além da Ilusão me ajudarem a ver o que eu não conseguia.

Minha sexta morte foi a primeira a tornar-se pública. E uma das mais sofridas. Aos 27 anos eu comecei a dar forma ao meu mundo de sonhos. Construí nele um enorme palácio de vidro verde. Recriei personagens que não eram meus numa aventura fantástica contada para quem quisesse ler. Tomei para mim o nome de um falso mago de outra história. Talvez minha paixão pela Ilusão me fez tentar me tornar como ela... Meu mundo de sonhos se tornou um mundo virtual e compartilhado com outras pessoas! Enquanto minha vida continuava se despedaçando. Deixei-me enganar por uma falsa paixão e fui surpreendido pela notícia que seria pai. Assustado, com medo de não ser mais a criança que eu era dentro de mim, ou de não conseguir ser um adulto, eu quis não mais acordar. Tinha 29 anos.

Três décadas de vida carnal e eu procurava um mundo para viver. Havia destruído meu mundo virtual e tentava o mesmo com o mundo de sonhos. Infelizmente a anti-matéria que consumiu o Mundo de Oz não era suficiente para causar estragos quando eu sonhava. A ilusão lutava para manter o mundo de pé, enquanto eu lutava para manter-me de pé, sentindo-me deprimido por causa do trabalho e do relacionamento gasto havia tempo. Eu lutei comigo mesmo em terras sombrias ao final de uma guerra sem fim dentro dos meus sonhos. Com 31, me declarei morto. Era minha sétima morte. Oz agora era “The Dead” e encontrou seres fantásticos e uma bela gótica antes de ser enganado por mim mesmo naquela caverna. A ilusão me disse para enfrentar o escuro, mas o Senhor das Trevas foi quem me fez descobrir que o escuro estava dentro de mim. Quando Oz destruiu Zo e disse ter uma vida para viver, eu não sabia qual vida eu deveria viver...

32 anos de vida. Eu tentava encontrar um equilíbrio entre meu mundo e a realidade. O amor e a Ilusão haviam dado lugar a um lado sombrio e frio dentro de mim. Um segundo filho, a crença de que nunca mais seria amado a não ser por ela, a Cora em formato de gótica que permeava meus sonhos e que não passava de um ser de sonhos e histórias, além de um pessimismo sem fim que cobria minha alma me levou a deitar querendo morrer. Pela oitava vez. Quando Hades veio de encontro a mim para levar-me até a pira onde eu queimaria para renascer, como um pássaro mitológico, algo me dizia que toda aquela fantasia de mundos, sonhos e sagas fantásticas deveria ter um fim. Eu comecei a escrever esse fim antes de minha nona morte.

A idade de Cristo. O fim e o começo. A chamada ressurreição. A compreensão de que meu mundo não está só lá e este mundo – o real – não está só aqui. Não existe vários mundos e existe infinitos mundos. Oz perde o sentido e passa a fazer todo o sentido. Meu amor utópico morre para dar lugar a um amor real e verdadeiro. Amor é ilusão sim. Mas toda ilusão pode ser vivida com prazer e pé na realidade. Não existem regras, mas o Universo tem as dele. É preciso respeitá-las. A linha entre imaginação e loucura é tênue. Tudo isso eu ouvi de mim mesmo quando quis morrer pela última vez.
- Oz – eu disse a mim mesmo quando me encontrei num mundo além sonho – esta já e a nona vez que você morre.
Eu havia temido minha solidão no mundo real e tinha medo de quebrar. 10.000 dias depois de surgir em minha mente, o Mundo de Oz seria completamente destruído para começar tudo novamente. Agora ele faria parte de um mundo muito maior e sem limites: o meu mundo.

postado por The Oz às 17:35 |