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The Oz:

Um sonhador lúcido por natureza, eu caminho pelas ruas em constante devaneio. Olho a vida ao meu redor com os olhos de Will Eisner e a sensibilidade das histórias de Neil Gaiman. Alguém já me disse que sou o último dos românticos. De alma transparente, de coração ingênuo, calado e meio ermitão, talvez um dia eu me torne uma daquelas figuras mitológicas que dizem andar pelas ruas das cidades cinzas, mas que ninguém nunca viu. No fundo sou só um cara normal, com Orkut e amigos pseudo-malucos. Nada demais. No fundo, somos todos normais, mesmo com a esquisitice em moda.


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quinta-feira, 14 de julho de 2011

O Mundo de Oz - Tomo III: Dunkelheit - Cáp. 4 de 4

DUNKELHEIT
O Último dos Livros de Oz

Capítulo 4 – Under The Sun

Sob a sombra de uma velha árvore com parcas folhas vermelhas, eu procurava por uma caixa, enterrada naquele chão de terra úmida e escura, quase preta. O céu de uma cor laranja forte e brilhante me deixava perdido no tempo. Estava frio, muito frio. Depois de cavar com as mãos como quem procura por água num deserto, encontrei a pequena caixa de madeira. Sem a chave, tive que batê-la na árvore, arrancando-lhe uma lasca e abrindo a caixa. Logo algo saltou de dentro e caiu no chão. Era um livro antigo, com capas de couro e um estranho símbolo cóptico desenhado. Dentro, estava todo preenchido com estranhas letras que eu desconhecia. Parecia um diário ou algo assim. Então, ouvi um barulho... Olhei para o céu laranja e aos poucos fui percebendo que algo aproximava-se. Algo parecido com uma ave. Logo seus olhos flamejantes tornaram-se evidentes e quando me dei conta, uma enorme ave estava pousando diante de mim. Tinha quase o meu tamanho e penas compridas, também em tons de cor laranja. Lembrei-me dos desenhos que já vi de uma Fênix. E então não era mais uma ave, mas uma mulher. Nua, com longos cabelos ruivos e olhos flamejantes. Senti o calor dentro de mim e então ela tornou-se fogo! Era uma enorme chama que começou a consumir tudo em volta. A árvore, a caixa, o livro em minha mão e eu. Não senti dor. Acordei.

Depois de uma semana comum de trabalho, visitar meus filhos no final de semana e passar aquela tarde com minha mulher, o dia ainda parecia longe de terminar. Faltava algo, eu sentia. Sob a luz da luminária, imerso num turbilhão de músicas do passado e do presente, abri o livro que Hades havia me dado, com um ankh na capa e páginas em branco. Sonhei o final de uma história que seria o começo de outra e a transformei em tinta sobre aquelas folhas em branco.

Ele caminhava pela planície deserta como quem passeia na praia com os pés descalços, sentindo cada onda bater nas canelas. Vestia uma estranha roupa preta com um manto vermelho sobre um dos ombros. Sentia-se rei de um mundo que achava ter criado. Um mundo deserto, onde apenas um palácio de vidro verde fosco, sujo e escurecido pelos anos impunha-se sobre o nada. Enquanto caminhava para longe do palácio, lembrou-se de histórias que não eram mais suas, com personagens tirados de outras histórias, com trechos que lembravam muito um plágio mal feito. Afinal, seu próprio nome parecia um plágio de um homem perdido num mundo mágico, mas sem o conhecimento de nada além da arte de criar ilusões. Lembrou-se da Ilusão. Então parou de andar.
Com toda uma calma, agachou-se e apanhou um punhado de areia do chão. Sentiu uma brisa e então ficou de pé novamente. Olhou de onde o vento vinha e caminhou em sentido contrário, sentindo o ar soprar cada vez mais forte contra seu rosto. Quase não suportava mais andar de tão forte que era o vento, quando de repente tudo ficou calmo. Olhou em volta e viu uma fina e curva parede de vento. Pegou o que sobrou do punhado de areia que ainda estava em sua mão e jogou contra o vento. A areia espalhada circulou pelo vento e, estranhamente, começou a aumentar de volume e juntar-se, conforme ia girando em volta do rei do nada. Logo, uma imagem foi se formando em meio a areia e, como por mágica, foi tomando a forma de uma mulher. O pequeno mago deu um breve sorriso.
Da parede circular de vento saiu uma mulher de cabelos loiros e longo vestido branco. Era Mabi, a rainha da ilusão, a quem o mago havia transformado em nada já havia algum tempo. Ela sorriu.
- Olá, Oz. – ela disse – Não conseguiu viver sem mim?
O pequeno mago limitou-se ao silêncio e um breve sorriso em um dos cantos da boca.

Cora voltava de uma longa noite ao som de Poisonblack, After Forever e Pain of Salvation, muito vinho e outras bebidas destiladas, com nomes criativos que ela preferia ignorar, e uma frustrante tentativa de preencher seu vazio interior com conversas com seus amigos sobre filmes de vampiros, sexo e a futilidade da vida capitalista do ser humano. O álcool ainda tornava sua visão turva enquanto ela se ajeitava no ônibus a caminho de casa. Ela tentava ignorar - ou parecer que ignorava – as pessoas em volta, que provavelmente estavam a caminho do trabalho naquela manhã fria e chuvosa e pareciam ter pena daquela garota vestida de preto e uma mecha colorida no cabelo.
Sentou num banco próximo à janela, tentou por fones de ouvido e ouvir alguma música, mas o celular estava com a bateria descarregada. Ficou olhando a chuva pela janela. Tudo lá fora passando num borrão embaçado. Adormeceu.

Algo em Cora não deu importância ao fato de estar deitada sobre uma sepultura, num sombrio e nublado cemitério. Porém, seus olhos rapidamente trouxeram a lógica à tona ao abrirem-se, fazendo com que ela ficasse um pouco assustada. Ainda mais com o que parecia ser um estranho gato cinza fitando-a empoleirado numa lápide. Percebeu logo que se tratava de um sonho.
- Um sonho com Sandman ou sou Alice no País das Maravilhas? – disse para si mesma.
- Nem um, nem outro. – disse uma voz sombria em meio à neblina.
Cora levantou-se para olhar melhor entre a neblina e ficou sem saber quem era aquele homem estranho que se aproximava, magro, careca, com aparência funesta e uma espécie de cajado na mão, com um castiçal na ponta superior, uma veste vermelha escura e um estranho medalhão.
- É um prazer tê-la de volta, milady. Eu sou Mordenkainen, o demônio. Vim buscar-lhe para que encontre vosso amo.
- Não tão rápido, demônio. – disse alguma voz feminina antes que Cora pudesse entender o que estava acontecendo.
O demônio e a garota olharam para a lápide onde estava prostrado o gato. Ele calmamente lambeu uma das patas e olhou fixamente para os olhos de Cora e Mordenkainen. Ambos fitaram seus olhos no olho do gato e, quando conseguiram desviar o olhar novamente, estavam diante de uma mulher, alta, loira e vestida com uma roupa branca – apesar de parecer que havia algo não tão branco naquele tom de branco, mas que era difícil de dizer o que realmente Havaí de errado com aquele branco. Era Mabi, a rainha da ilusão.
- Maldita Ilusão! – praguejou o demônio – Achei que o mago tinha destruído você!
- Não se destrói uma lenda, lacaio. Volte para o Escuro e diga-lhe que esteja pronto para brincar, pois vou começar um jogo aqui.
E, com raiva e a contragosto, Mordenkainen sumiu entre a névoa.
- Que sonho louco é esse? – perguntou-se Cora.
- Como diria um amigo meu... – disse Mabi, virando-se para ela e estendendo-lhe as mãos, como quem faz gesto para um número mágico – “É o seu sonho dos sonhos”.
Cora sentiu uma brisa e piscou. Mas quando abriu os olhos, não estava mais no sombrio cemitério, e sim numa espécie de deserto. Tudo em volta tinha uma cor amarelada em tons pastéis. Percebeu que havia algo em sua mão. Era uma carta. Leu e, antes que sua mente tenta-se fazê-la acordar, colocou a carta no bolso, escolheu um lado e começou a caminhar. Na carta estava escrito o seguinte:

“Olá, antes de perguntar-se que tipo de sonho maluco é esse, devo dizer que você faz parte de uma história. Algumas vezes, enquanto estiver dentro desse sonho, lembrará disso. Na maioria das vezes, não.
Como todo personagem de uma história, há uma jornada esperando por você, a qual você terá de trilhar, conforme lhe for conveniente, mas também estará sujeita às conseqüências e terá que lidar e conviver com outros personagens dessa história. Poderá acordar ao final de cada sonho e no final do dia, quando dormir, estará de volta à história.
Cuidado! Suas angústias e medos, tanto quantos seus desejos, não ficarão escondidos e poderão ser usados contra você! Mas se souber lidar com os elementos da história, os problemas serão facilmente contornados.
Sua jornada aqui não envolve busca por tesouros ou coisas mágicas. Sua jornada é necessária para que garanta sua existência. Sem jornada, você deixará de existir, e esse mundo desaparecerá.
Aliás, este mundo já foi de outra personagem, criado por mim com nome emprestado de outro personagem. Você ouvirá o nome dele vez ou outra. O chamam de Oz e, após construir e destruir esse mundo mais de mil vezes, ele resolveu abandoná-lo de desaparecer. Alguns dizem que este “mago” vaga por este mundo de sonhos e que apesar dele parecer abandonado, está em constante re-construção.
Mas não prenda-se a histórias de outros personagens. São somente histórias. São somente personagens. Tudo é somente sonho.
Este sonho é seu e esta é a sua história.
Comece sua jornada, e tenha bons sonhos.”

...



...

postado por The Oz às 15:21 |

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O Mundo de Oz - Tomo III: Dunkelheit - Cáp. 3 de 4

DUNKELHEIT
O Último dos Livros de Oz

Capítulo 3: Wasteland

“I still believe in God, but God no longer believes in me.”

Eu e o Nono Oz caminhávamos pelo que eu chamaria de A Entrada, dez lápides em círculo, com um estranho desenho no chão. Ele parecia bastante perdido, como sempre. Havia desistido de viver pela nona vez e, ao dormir, veio parar aqui, onde eu crio histórias para que eles possam acordar para uma nova vida. Assim como todos os outros, chegou sem saber quem era e onde estava e eu logo o levaria à Sala dos Espelhos. Depois. Agora, não.
- Aqui é por onde você e os outros entraram. – eu disse – Cada vez que vocês desejam morrer, saem dessas sepulturas para serem zumbis aqui. Até acordarem e para tentar fazer tudo diferente, negando o passado. Você é o nono a fazer isso. Aqui existem dez sepulturas.
Apontei para a única cova aberta.
- Esta é sua última cova. Quando vier por ela, não irá mais voltar. Pense nisso.
O nono Oz caminhou até a lápide e pegou uma pequena boneca de pano que estava largada no chão. Sentiu-se como alguém que deve esquecer algo e então jogou a boneca longe.

Levei o Nono Oz até o Palácio de Vidros Verdes e dei-lhe O Livro e o ankh. Mas antes sentei pela última vez em meu trono e contei-lhe uma pequena história.
- Uma vez um cara começou a escrever uma história...
Ele torceu o nariz.
- Escute, cara. É sério. – eu disse – Uma vez um cara começou a escrever uma história. Era um cara tímido, problemático, que não se enturmava muito. Sozinho em seu quarto, ele descobriu que tinha facilidade para criar histórias e então resolveu bolar um monte delas. Mas alguma coisa aconteceu. Ninguém sabe dizer o que é, porque ninguém viu acontecer, estavam preocupados com suas próprias vidas. E esse cara estava tão imerso em seu mundo que não se deu conta do que estava acontecendo. Então um dia ele foi forçado a sair do mundo que havia criado e viver a realidade. Foi uma catástrofe! Então esse cara resolveu criar um outro “eu” e contar histórias dele como se fosse dele mesmo e não de um personagem. Eram histórias bem malucas e fantásticas e ele achou que as pessoas realmente acreditariam que ele era aquele outro cara que ele havia criado. Mas com o tempo, ele foi ficando deprimido e percebeu que seu outro “eu” poderia ser uma válvula de escape. Ledo engano... Era só um personagem. Hoje, esse cara sabe disso. E por isso ele decidiu que seu personagem precisa ter sua própria história, assim como todos nós. É por isso que estou lhe dando O Livro.
O Nono Oz folheou as páginas em branco.
- Você deve ter sua própria história. Você não é mais eu - eu disse.

Na Sala de Espelhos, onde cada vida é revelada, pus o Nono Oz de frente à Janela de Cristal, o espelho que realmente é um espelho.
- A escuridão cobriu minha alma, Oz. – eu disse – E há uma grande parte dessa escuridão em você. Olhe pelo espelho, e você verá que somos um, que aqui é seu lugar e não o meu.
Então, ele olhou para o espelho, e viu por além das fronteiras dessa terra perdida cheia de contos e histórias. Viu os outros oito dele mesmo levantarem-se para a caminhada para si mesmo e sentiu o vento gélido de todos aqueles seres imaginados e mortos para que ele chegasse até ali. Eu vi. Ouvi a música incessante permear todo o Reino junto com o vento que transformava tudo em pó. No fim, só havia deserto e silêncio. Havia terminado. Havia começado. Eu vi, diante do espelho, Oz sumindo no reino dos sonhos, enquanto eu refletia sobre minhas 9 mortes. Senti todas as dores e lembrei-me de toda a jornada que ele disse que eu havia caminhado. Eu não queria mais morrer. Toda aquela história que Oz contou-me em seu trono fazia sentido. Havia todo um caderno branco e infinito comigo. Peguei-o junto do ankh que ele me deu e atravessei o espelho.

Acordei do sonho dos sonhos com uma estranha leveza acompanhado de um peso que carregaria para sempre. Tudo parecia iluminado, e minha alma estava mais obscura do que nunca. Mas ainda assim, as imagens que sempre permeavam minha mente o tempo todo haviam sumido. As palavras, os sons... Nada! Alguma coisa faltava. Algo ainda deveria ser feito...

postado por The Oz às 03:48 |

quinta-feira, 15 de julho de 2010

O Mundo de Oz - Tomo III: Dunkelheit - Cáp. 2 de 4

DUNKELHEIT
O Último dos Livros de Oz

Capítulo 2: 10.000 Days

“Listen to the tales and romanticise

How we follow the path of the hero
Boast about the day when the rivers overrun
How we rised to the height of our halo

Listen to the tales as we all rationalise
Our way into the arms of the savior
Fading all the trials and the tribulations
None of us have actually been there”

Sentado em minha cama, olhando para a TV desligada, ouvindo o som envolvente das músicas no mp3 player, que penetram meus ouvidos e minha mente, eu penso em tudo o que foi e o que eu imaginei que foi. Todas minhas vidas e minhas mortes. Tudo o que eu quis acreditar ser verdade. Ou não.

Eu tinha uns seis anos de idade. Primeiro ano na escola. Mais interessante que as aulas e os outros amiguinhos, era viajar dentro de mim mesmo, imaginando mundos e histórias. Eu tinha uns seis anos de idade. Num sonho, vi um deserto – deveria ter visto uma foto ou um filme, nunca tinha ido num deserto – só areia e nenhum barulho, nem cheiro, nem nada. Afinal, era um sonho. Talvez eu a tenha criado ou ela tenha aparecido, não sei. Mas algo parecido com um dragão vermelho apareceu no meio do deserto e se transformou numa moça. Parecia uma espécie de deusa, sei lá. Ela me disse que aquele deserto era um bom lugar para eu construir meu palácio e meu mundo. Eu comecei a imaginar várias histórias depois disso. Era melhor ficar em meu quarto, imaginando histórias com meus brinquedos velhos, imaginar que um trem poderia ser um robô alienígina e não um trem. Eu gostava. Eu tinha só seis anos de idade. Mas isso incomodava algumas pessoas, eu era avoado, e era castigado por isso. Depois de uma surra tudo que conseguiram foi me deixar ainda mais fechado em meu mundo. Eu senti uma parte minha morrer. Foi minha primeira morte. Eu tinha uns sete anos, então.
Lembro de ter sonhado com um estranho cemitério em meio à neblina e ser guiado por uma garotinha pálida de cabelos pretos. Não lembro se foi naquela época (o sonho), se foi depois ou se foi tudo minha imaginação...

O acidente de carro me fez ficar em casa por uma semana. Minha mãe ainda em uma cadeira de rodas até que sua bacia se colasse novamente (ou algo parecido), meu pai correndo atrás dos responsáveis por transformar o Fusca em ferro-velho e tudo o que eu tinha era meu mundo de sonho. Acho que eu tinha uns 9 anos. Ele ainda não tinha forma definida. Era um deserto cheio de personagens e histórias que mudavam com cada vento que soprava. Ainda fechado, eu sofria nas mãos dos valentões da escola. Um gordinho a quem chamavam de “Repolho” implicava comigo vez após vez. Minha perna ainda doía, minha mãe ainda estava se recuperando e ele ainda me enchia. Tudo que Repolho conseguiu foi uma cadeirada nas costas – literalmente – e fazer parte de uma história que veio em minha cabeça mais tarde. Umas aventuras de eu mesmo com outro nome. Tudo que eu consegui foi ter mais e mais problemas para fazer amigos. Quieto e tímido, me fechei e me fechei em meu mundo de sonho, até o dia que quis morrer por ser tão diferente e me sentir sozinho. Eu tinha uns 12 anos. Foi minha segunda morte. Foi quando sonhei com um gato branco engraçado que me serviu de mestre. Acho.

Rebelde, como todo adolescente, eu tentava deixar o cabelo crescer novamente. A camiseta de bandas de heavy metal, o jeans rasgado e o aspecto meio sujo afastavam mais as pessoas. Hoje não é mais assim. Hoje é legal ter esse aspecto. Naquela época não. Mas eu não ligava. Desde os 14 anos eu passei a viver em meu próprio mundo e o punha numa guerra contra o mundo que estava sendo imposto a mim. Meus sonhos viravam letras de música e histórias difusas e perdidas. Meu mundo não tinha rumo. Nem eu. Naquela noite, depois de tanto brigar com todos e questionar-me se realmente valia a pena lutar por um mundo de sonhos, eu quis morrer. De verdade. Tinha uns 19 anos e queria muito morrer. E morri. Pela terceira vez. Meu corpo acordou depois de uma noite de remédios, bebedeira, vexames que minha memória preferiu não gravar e minha falha em não viver mais. Uma longa caminhada até em casa me fez desabar na cama e sonhar com uma gótica tentando me salvar e um enorme corvo me pegando e me jogando dentro de um poço. Minha cabeça tentava agüentar a ressaca e minha mente brincava comigo com personagens de Edgar Allan Poe...

O amor é uma ilusão. Talvez seu eu soubesse disso antes, não teria caído nos sonhos que aquela garota loira vestida de branco criou para mim em meus próprios sonhos. Deixar seu mundo sem rumo, sem tomar conta dele, dá oportunidade para seres como àquela que eu descobri ser a própria Ilusão, entrarem e fazerem dele ainda mais uma bagunça. Afinal, eu tinha 21 anos e estava apaixonado. Meu amor acabaria tornando-se uma princesa em minhas histórias, numa teimosia em manter algo que não mais existia. Claro que depois eu tentaria mudar isso. Quando fui expulso de casa e fui parar numa pensão caindo aos pedaços, cheia de pessoas de origem e intenções duvidosas, meu amor começou a ruir. Meu coração se entristeceu por ter abandonado meu mundo de sonhos. Senti-me muito mal por vender meus sonhos e minha alma ao amor e deitei naquele quarto só com uma cama e nada mais olhando para o teto e querendo morrer. Foi minha quarta morte. Eu tinha 22 anos.

Eu tinha 24 anos quando as torres gêmeas caíram. Eu tentava voltar a assumir meu mundo e me entender com aqueles que eu amava. A Ilusão me ajudou a criar mais e mais coisas para preencher meu mundo. A cada sonho eu viajava para mais longe e vivia histórias cada vez mais fantásticas. Eu tentava voltar a ser criança. Eu me enganei assim por mais de ano, até minha fatídica quinta morte, aos 25 anos e pouco, quando, sem trabalho e vagando pelos trens da cidade que eu rebatizaria de Hell City, eu tive um momento de sobriedade e me vi numa vida miserável e sem sentido. Foi quando comecei a ter mais sonhos metafísicos, numa tentativa de forças além da Ilusão me ajudarem a ver o que eu não conseguia.

Minha sexta morte foi a primeira a tornar-se pública. E uma das mais sofridas. Aos 27 anos eu comecei a dar forma ao meu mundo de sonhos. Construí nele um enorme palácio de vidro verde. Recriei personagens que não eram meus numa aventura fantástica contada para quem quisesse ler. Tomei para mim o nome de um falso mago de outra história. Talvez minha paixão pela Ilusão me fez tentar me tornar como ela... Meu mundo de sonhos se tornou um mundo virtual e compartilhado com outras pessoas! Enquanto minha vida continuava se despedaçando. Deixei-me enganar por uma falsa paixão e fui surpreendido pela notícia que seria pai. Assustado, com medo de não ser mais a criança que eu era dentro de mim, ou de não conseguir ser um adulto, eu quis não mais acordar. Tinha 29 anos.

Três décadas de vida carnal e eu procurava um mundo para viver. Havia destruído meu mundo virtual e tentava o mesmo com o mundo de sonhos. Infelizmente a anti-matéria que consumiu o Mundo de Oz não era suficiente para causar estragos quando eu sonhava. A ilusão lutava para manter o mundo de pé, enquanto eu lutava para manter-me de pé, sentindo-me deprimido por causa do trabalho e do relacionamento gasto havia tempo. Eu lutei comigo mesmo em terras sombrias ao final de uma guerra sem fim dentro dos meus sonhos. Com 31, me declarei morto. Era minha sétima morte. Oz agora era “The Dead” e encontrou seres fantásticos e uma bela gótica antes de ser enganado por mim mesmo naquela caverna. A ilusão me disse para enfrentar o escuro, mas o Senhor das Trevas foi quem me fez descobrir que o escuro estava dentro de mim. Quando Oz destruiu Zo e disse ter uma vida para viver, eu não sabia qual vida eu deveria viver...

32 anos de vida. Eu tentava encontrar um equilíbrio entre meu mundo e a realidade. O amor e a Ilusão haviam dado lugar a um lado sombrio e frio dentro de mim. Um segundo filho, a crença de que nunca mais seria amado a não ser por ela, a Cora em formato de gótica que permeava meus sonhos e que não passava de um ser de sonhos e histórias, além de um pessimismo sem fim que cobria minha alma me levou a deitar querendo morrer. Pela oitava vez. Quando Hades veio de encontro a mim para levar-me até a pira onde eu queimaria para renascer, como um pássaro mitológico, algo me dizia que toda aquela fantasia de mundos, sonhos e sagas fantásticas deveria ter um fim. Eu comecei a escrever esse fim antes de minha nona morte.

A idade de Cristo. O fim e o começo. A chamada ressurreição. A compreensão de que meu mundo não está só lá e este mundo – o real – não está só aqui. Não existe vários mundos e existe infinitos mundos. Oz perde o sentido e passa a fazer todo o sentido. Meu amor utópico morre para dar lugar a um amor real e verdadeiro. Amor é ilusão sim. Mas toda ilusão pode ser vivida com prazer e pé na realidade. Não existem regras, mas o Universo tem as dele. É preciso respeitá-las. A linha entre imaginação e loucura é tênue. Tudo isso eu ouvi de mim mesmo quando quis morrer pela última vez.
- Oz – eu disse a mim mesmo quando me encontrei num mundo além sonho – esta já e a nona vez que você morre.
Eu havia temido minha solidão no mundo real e tinha medo de quebrar. 10.000 dias depois de surgir em minha mente, o Mundo de Oz seria completamente destruído para começar tudo novamente. Agora ele faria parte de um mundo muito maior e sem limites: o meu mundo.

postado por The Oz às 17:35 |

segunda-feira, 21 de junho de 2010

O Mundo de Oz - Tomo III: Dunkelheit - Cáp. 1 de 4

DUNKELHEIT
O Último dos Livros de Oz

Capítulo 1 - Dukelheit

“Cada um encontra para si um jeito de esquecer a vida, porque a vida dói demais, mas é preciso seguir com ela”.

Tudo em volta era sombrio e triste. Do lado de fora da caverna, tudo era escuridão. Ventos cortantes e uivantes corriam pela escura caverna ao pé de uma montanha. Lá dentro, alguém chorava. Parecia um homem – um garoto – envergonhado de si mesmo. Mas quando Hades, o senhor dos mortos e das Trevas chegou, apenas eu estava lá, com minha roupa de palhaço triste. Eu havia dito que era o Escuro, tomado a identidade de Hades, para poder dizer a mim mesmo (o garoto chorão) que deveria começar a viver. Hades aproximou-se. Senti mais frio.
- Foi como achou que fosse? – perguntou.
- Acho que sim... Nunca tenho muita certeza de nada.
Tentei limpar a maquiagem, transformando meu rosto num borrão. Hades olhou em volta.
- Poucas pessoas que conheci em minha eterna existência recriaram o Mundo Subterrâneo tão bem. Suas Trevas são quase tão soturnas quanto as minhas.
- Isso é um elogio? Não se sente mal por um sonhador aprendiz de escritor utilizar você e seus domínios sem permissão?
Acho que vi um leve sorriso no canto da boca de Hades. Difícil imaginar Hades sorrindo.
- Não pertenço a mim, pequeno Oz. Sou tão mitologia quanto você. Somos história, e só existimos quando alguém dedica parte de seu tempo a elas.
Sorri e parti ao encontro do Nono Oz. Precisava terminar. Ligar o fim ao começo...

Depois de falar comigo mesmo, dizer-me coisas que achei que nunca ouviria de alguém como eu, ainda me perdi por outros sonhos antes de acordar. Percorri por uma estranha floresta de árvores longas e compridas. Estava frio e escuro. Na verdade, era como se todos os meus mundos de sonhos estivessem imersos em escuridão. Parei. A escuridão não estava em meus mundos. Estava em minha alma. Acordei.
Tentei levar o dia numa boa, mas não dava mais. Tudo estava diferente. Os problemas do mundo real, da vida quando se está acordado, pareciam pequenos diante dos problemas que eu tinha dentro de mim. Quando disse a mim mesmo que eu era o Nono Oz e que eu “ressuscitaria” para viver minha décima e última vida, achei que estaria tudo bem, que meus problemas não existissem mais, que eu estaria “zerado”, pronto para uma “vida nova”. Mas não é assim que funciona. Não mesmo.

Lá estava eu em meu reino, dentro do meu palácio de vidro verde, sentado em meu trono de papel, pensando em como tornar aquele mundo de sonhos sombrio e deserto em algo um pouco mais interessante. Perdi um tempo imaginando outro trono ao meu lado e pus o corpo de Cora ali sentada, pálida e fria como gelo.
- A Inês é morta, caro Oz. – alguém disse.
Era Hades, o ser mitológico responsável pelo lugar para onde os mortos vão.
- Não adianta depositar seus sonhos nas mãos de uma rainha morta. Será apenas um adorno em putrefação. – ele disse.
- Alguma idéia para aproveitar esse Inverno que tem permeado meus sonhos? Depois que mandei Cora e Mefistófeles disfarçados ao meu passado para resgatar eu mesmo das mãos da Estrela da Manhã às vésperas de mais uma das minhas mortes, o anjo acabou morto. Depois que decidi enfrentar a Ilusão, meu amor ideal também acabou morto. Você perdeu seu ajudante e sua ninfa raptada. O que pode vir agora? Melhor tomar cuidado, senão destruo seu mundo também...
Hades riu. Não um sorrisinho, mas uma bela gargalhada, que o eco causado pelas paredes de vidro só fez ficar mais escandalosa. Quando parou, Hades virou-se para o pequeno globo que ficava no centro no salão. Era a Máquina do Mundo, uma miniatura do meu universo.
- Alguém que cria seu próprio universo quando está dormindo e o expande quando acordado sabe que todo universo tem um fim e um começo. Tome.
O velho esticou suas mãos sombrias e me entregou um livro. Tinha uma capa de couro com o símbolo de um “ankh” na capa. Dentro, somente páginas em branco.
- Se admira tanto o inglês criador dos Mestres dos Sonhos, sabe que assim como ele você é um deus em seu mundo. Por mais que lá fora as pessoas se submetam a religiões e filosofias alheias por falta de confiança em seus próprios sonhos, você sabe que é senhor de seu mundo e de sua vida. Por muito tempo você tem vivido em meus domínios. Trouxe seu reino para cá, intitulando-se um “morto”, mas aqui não é seu lugar. Um dia você pisará em meus domínios e não poderá deixá-lo mais. Pense nisso.
Então o senhor da Escuridão deixou meu palácio. E eu fiz a última das minhas reflexões e decidi terminar minha história sem usar seres mitológicos pré-existentes e recomeçar a reescrever aquelas páginas em branco com minhas palavras. Precisava falar com o último Oz.

postado por The Oz às 16:07 |

terça-feira, 11 de maio de 2010

O Mundo de Oz - Tomo II: Delirium - Cáp. 6

.delirium

Capítulo 6: Brighter Than The Sun

“E saiu disparado pela porta, correndo pelas ruas de Hell City.
Conforme corria, Oz via o Mundo se desfazer atrás dele. A anti-matéria estava consumindo tudo que encontrava pela frente. Oz chegou em casa e se trancou no quarto. Era hora de começar a planejar e construir seu novo Mundo. O velho já não fazia mais parte da sua vida. Lá fora, quase tudo era branco, um vazio, o nada. E o nada - a anti-matéria - ia se aproximando, consumindo tudo à sua volta até finalmente alcançar o quarto de Oz e ele mesmo. Tudo havia se tornando um branco sem limite. Um nada.
O fim do Mundo havia chegado.”
(Mundo de Oz 2.0 – Saga do Fim do Mundo, 2005)

Certa vez sonhei que estava de pijamas dentro de uma caixa de papelão. Um gato engraçado falava comigo sobre usar meus mundos que eu criava em minha mente para outras coisas mais nobres do que apenas para me divertir. Chamei aquele fragmento de sonho de “Sonho 1.138”, numa alusão a um filme em que um cara vai de encontro às pessoas normais e foge, em busca de um mundo melhor lá fora. São comuns em minha vida esses sonhos com referências que sempre escondem algo por trás. Como esse que estou tendo agora, onde encontro um quadro escrito "One who knows too much eventually goes insane.", uma frase dita por Delírio em alguma história do Sandman. Uma frase que poderia vir da boca de Mabi, enquanto ela passeia pelo Salão da Verdade, dentro do meu palácio esmeralda.
- Então, é aqui onde tudo é criado? – perguntou a Ilusão, enquanto passeava pelo enorme salão cheio de todo tipo de quinquilharia. Debruçou-se sobre o trono do Rei Nada.
- Não. – eu disse, secamente, pegando a Caixa de Coisas Mortas com a boneca de pano de Cora dentro. – Aqui é pra onde vêem as coisas depois de criadas e usadas. É onde me lembro quem já fui e quem sou de verdade.
Ela pegou um elefante de pelúcia queimado.
- Me parece um depósito de brinquedos que não se usa mais. – trocou o elefante por um gato branco de gesso com um medalhão japonês no pescoço. - Como sabe se suas criações não foram minhas criações? A saga da pré-estréia, por exemplo, poderia ela toda ter sido uma ilusão...
- Da mesma forma que sei que você também é criação da minha cabeça.
Ela riu alto.
- Querido, eu já existia antes de você me usar numa história! Você já me viu em sonhos reais desde que era pequeno. Sem falar de outros “personagens” – disse isso fazendo as aspas com dois dedos de cada mão. – Eles não são criação sua. Como Lúcifer, por exemplo.
Seu olhar quando disse isso me fez correr um frio sobrenatural pela espinha.

Acordou sobre uma sepultura com o nome de “Oz”. Não sabia se era ele, ou quem era. Sentiu um frio de gelar a alma e o ar soturno deveria dar-lhe medo, mas de fato sentia-se em casa. Ouviu algo. Procurou e encontrou um gato branco sentado sobre uma das sepulturas fora daquele círculo de dez túmulos em que estava. O gato pulou e perdeu-se na neblina. O garoto resolveu segui-lo. Sentiu algo vivo na neblina. Algo que sussurrava coisas inteligíveis. O gato branco parou. Estava no colo de um homem velho, mas de aparência vigorosa e sinistra.
- Olá, Segundo. – disse o velho, com voz ríspida e gelada. – Eu sou o Senhor das Trevas e vim lhe buscar para que passe para o outro lado renascido.
- Como assim? – perguntou o garoto, confuso como todos os outros. – Eu morri?
- De certa forma. – disse o homem, caminhando por um corredor de negras árvores secas, que curvavam-se umas de frente para outras, como um túnel.
- E... renascer? Como assim? Como isso será possível? – perguntou o garoto, seguindo-o.
- Da mesma forma que a Fênix. Queimando.

Mabi parou diante de uma das janelas do salão.
- Entenda, Oz. Você pegou todos aqueles sonhos malucos, incluindo os que entidades como eu lhe visitamos, e transformou em historinhas. Seria uma forma de não enlouquecer? Ou no fundo você só está “pregando a nossa palavra”?
Não sei o porquê, lembrei de mim entre milhares de corpos e a cara cheia de sangue, escorrendo pelo cabelo comprido, prestes a matar Zo, um lado sombrio de mim mesmo. “Não se pode matar a si mesmo sem morrer junto”, ele disse.
- Acho que nunca fui normal e não sou religioso. Acredito que somente fiz o que pedia minha vocação. Não acredito que tenha feito algo que eu de fato não quisesse. Você foi usada por mim, Mabi. E nunca fui um dos bonecos de Lúcifer, apesar de algumas pessoas terem achado que sim, em certos momentos de minha vida. A maldade não corre em minhas veias e estou longe de ser totalmente insano. O Mal e a Ilusão nunca me dominaram.
Ela ficou séria.
- Se a sua intenção foi a de me aprisionar num mundo irreal e a da Estrela da Manhã de usufruir de minha loucura e talento para fins maléficos, vocês se deram mal. Pois só o que conseguiram foi tornarem-se “personagens” – minha vez de fazer aspas com os dedos – de meus mundos particulares.
Ela começou a preparar-se para me enfrentar, e eu para matá-la e não sonhar mais com ela.

O menino trancou-se no quarto chorando, após a pior surra que havia levado do pai. Estava cansado de ser o bobo da classe, de não saber fazer amigos, de ser bonzinho demais e de nunca ser bom o suficiente para os pais. Sentia-se bem quando criava um mundo à parte em sua cabeça e esquecia do resto. Não podia ter os brinquedos que queria e que as outras crianças tinham, então resolveu criar sua própria diversão.
- Vou criar meus próprios mundos e viver neles! – disse, enxugando as lágrimas.
Pela primeira vez na vida, desejou morrer por ser tão difuso do mundo real, mas tudo que fez foi adormecer. O que era bom, pois sua imaginação fluía melhor nos sonhos. Sonhou com uma garotinha loira vestida de branco que lhe entregava um livro em branco. Quando acordou – ou achou que havia acordado – estava deitado sobre um gramado, sob uma enorme lua branca, num estranho cemitério coberto por uma espessa neblina. Ouviu uma voz feminina:
- Ah, eu adoro essa neblina! – ela disse – Nos faz caminhar sem saber o que há no próximo passo.
Com certa dificuldade, viu uma garotinha de pele pálida, cabelos negros, roupa preta e com fortes marcas nos pulsos.
- Oi, Oz. – ela disse.

O corredor de árvores terminou numa espécie de templo em ruínas, onde o velho com o gato branco abriu a porta e revelou um enorme salão com uma espécie de pira ao centro de uma espécie de altar, onde uma enorme ave de mármore esticava suas asas até o teto.
- Sabe, sempre que você vem para esse lado, tudo que tem que ser feito é levá-lo para o renascimento. Mas às vezes alguns interferem, para tentar mantê-lo aqui. – disse o enorme homem sombrio para o garoto. – Eu não posso fazer isso que estou fazendo, pois tenho um reino de Trevas e mortos de verdade para administrar, sabe? Mas eu gosto de você e quero contribuir para que tudo siga seu curso.
O garoto parecia não entender nada e de fato, não estava entendendo mesmo. O Senhor das Trevas o pôs dentro da pira e acenou com uma das mãos para o alto. O ar azulado e sombrio, frio, começou a ser iluminado por uma luz amarela que vinha de um buraco no teto do templo, até todo o ambiente ficar dourado e quente.
- Isso, é claro... – disse o velho – até a sua nona morte. Porque então só lhe restará a décima e última, que somente Aquele Que Permeia o Universo sabe quando será. O que sabemos, é dessa você não renascerá.
A luz amarela centralizou-se na pira e o garoto começou a brilhar como um Sol, até queimar e virar cinzas.
Acordei desse sonho me sentindo muito melhor do que quando adormeci, na noite anterior, quando estava com vontade de não existir mais, tamanho sofrimento que estava sendo minha pré-adolescência.

De repente, meu Salão da Verdade havia se tornado um monte de imagens confusas e obscuras. Mulheres que um dia desejei estavam se oferecendo pra mim e me repudiando ao mesmo tempo. Eu era um rei de meu mundo e podia fazer o que quiser, assim como me vi muito mai bonito do que eu era de verdade e as pessoas se importavam comigo, apesar de eu esnobá-las. Os caras que eu detestava estavam caindo mortos, um a um e um documentário sobre minha vida estava sendo feito, já que eu era alguém tão importante para a História. A mulher que eu amei estava implorando para que eu voltasse a ficar com ela, mas eu estava mais preocupado com a mulher perfeita que havia encontrado agora: com corpo perfeito, sexo maravilhoso e que me compreendia e não tinha nenhum defeito. Tudo ilusão.
- Você já foi melhor, Mabi. – eu disse. – Não precisa ficar desesperada, não tenho poder de matá-la de verdade, você sabe disso. Ninguém pode matar um conceito, uma idéia. Apenas vou eliminá-la de meu mundo e dos meus sonhos e tudo que restará será uma pedra com seu nome nela.
- Tantos delírios, para você terminar sozinho e melancólico. – disse a Ilusão. – Você pode estar descobrindo quem é e pra que veio a este mundo, Oz. Mas a que preço?
- Não é assim a vida? Tentamos encontrar sentido nela e às vezes chegamos ao fim dela sem ter certeza de nada. E no caminho temos alguns ganhos e algumas perdas...
Passei a mão pelo ar e então estava de volta ao Salão da Verdade. Encontrei e peguei um livro na mão. Não havia nada na capa, mas seu interior estava quase todo escrito.
- E, sabe Mabi... – eu disse, sorrindo – Não terminou. Só está começando.
Então soprei o livro e as folhas foram virando e as letras se pagando, virando pó. A loira de branco começou a se desfazer em poeira também. Quando a última letra havia sumido, Mabi já não existia mais. Não dentro daquela sala. Não em meu mundo. E eu tinha em minhas mãos um livro com páginas novamente em branco.

Sentei na cama, em minha nova e diminuta casa. Havia finalmente saído da casa dos meus pais e agora estava vivendo sozinho. Pensava em ser um bom pai para meus dois filhos pequenos, mas não conseguia vê-los com a freqüência que gostaria, desde que havia terminado meu relacionamento com a mãe deles. Meu coração agora pertencia a alguém cuja alma era idêntica à minha. Mas eu havia acabado de perder mais um emprego e algo fazia eu me sentir mais triste do que das outras vezes. Eu estava com dificuldade de viver e isso me dava vontade de não acordar após o adormecer. Então, abri os olhos e estava num cemitério estranho, com dez sepulturas formando um círculo, sobre uma estrela de dez pontas desenhada na terra. Algo me dizia que eu já estivera ali. Ainda mais quando um homem com roupas de arlequim surgiu, dizendo que seu “mestre” queria me ver. Mais estranho ainda foi ele me chamar de Nono Oz e me por diante de um espelho onde éramos uma pessoa só.
- Os deuses da vida começam a sumir atrás das lágrimas! Como iríamos saber por que escolhemos o caminho que seguimos? Por que machucamos aqueles que amamos? Parece que não há muito tempo para perder com reflexões... – ele começou dizendo.
E tudo o que eu sentia era uma enorme escuridão cobrindo minha alma.



A seguir: o último tomo da saga "O Mundo de Oz": "Dunkelheit", em 4 partes!
:]

postado por The Oz às 00:43 |

sexta-feira, 30 de abril de 2010

O Mundo de Oz - Tomo II: Delirium - Cap. 5

.delirium

Capítulo 5: Rush (The Living Dead)

Corri tudo que pude por aqueles corredores sombrios, até chegar a um beco sem saída. Podia ouvir os latidos de longe. Podia ouvi-los aumentando e sentir a aproximação do fim. De repente, vejo os olhos vermelhos de um deles. E também seus dentes rangendo. Então, apareceu outro. E mais outro e mais outro. Quatro cachorros ferozes que mais pareciam lobos selvagens sedentos por sangue. Queria acordar. Precisava acordar daquele pesadelo! E acordei, bem na hora em que me tornaria comida canina. Eu estava ofegante como sempre após um pesadelo. Lembrei-me de uma vez jogando RPG, quando o mestre fez com que um mago rival me pusesse um feitiço eterno no qual eu nunca poderia me aproximar de um cachorro ou lobo, ou enlouqueceria.

O anjo caído entrou e caminhou com certa sobriedade e arrogância pelo quarto de Damien, vislumbrando a cena do filho adormecido entre mulheres nuas e demônios. Só fez barulho quando quis que seu filho acordasse. E assim o fez irritando um dos cachorros deitados num dos tapetes. Damien despertou, nada surpreso.
- Acorde. – disse a Estrela da Manhã.
- O que é tão urgente?
- O medalhão de Agat. Vim buscá-lo. Cora está diante de meu trono à espera dele.
- Mas... – agora, Damien parecia surpreso.
- Filho... – disse Lúcifer, pegando o medalhão sobre uma mesa – Você tem que entender que, se Ele entregou seu filho para morrer para contar uma história, porque eu não mataria o meu por uma?
E antes que Damien levantasse da cama, um breve olhar do anjo negro para o cachorro fez com que uma raiva incontrolável despertasse dentro do animal, que pulou sobre o Damien, estraçalhando sua carne até que não mais se movesse. Os seres nus continuavam adormecidos e os demônios sorriam, enquanto o enorme cachorro tomava forma humana.
- Vou usá-lo agora. – disse Lúcifer olhando para o medalhão – e ele voltará para suas mãos depois da tarefa de Mabi. Para que cumpra seu papel no passado, Sith.
- Que assim seja, milórde – disse o homem de olhos vermelhos que outrora era um cão.

Eu sabia que aquele não era um sonho comum. Algo naquele lugar parecia irreal, mas também havia algo de mitológico, mágico. Ainda mais com a bela garota pálida com suas vestes e cabelos pretos. Achei que estava num belo sonho e que iria me dar bem. Ledo engano.
- Esta rocha, com estas inscrições, representa Mabi, a Rainha das Nixies, das fadas. A Ilusão. – disse ela para mim. – E aquela rocha lá embaixo, na pequena ilha, é você.
- Eu? Nem sei que lugar é esse.
- O Limbo. O lugar onde você cria seus mundos, suas histórias... – ela disse.
- Se tudo isso aqui é fruto da minha cabeça, como você sabe mais sobre tudo isso do que eu? Eu não faço idéia do que você está falando... – eu disse.
- Não esquente, Sétimo Oz. Vai se lembrar em breve. – disse Cora, com ar cabisbaixo.
Então, eu ouvi algo e senti o ar se contorcer, mas sem ventar. Olhei para cima, à minha esquerda, e tive uma visão que não se vê todos os dias: uma loira vestida de branco surgiu do nada, como um fantasma e “pousou” no gramado. Tudo que consegui fazer foi prestar atenção no diálogo entre ela e Cora.
- Ora, se não é o brinquedo de Hades. Como chegou aqui, arremedo de personificação antropomórfica. – disse a loira.
- Guarde seus insultos pra você, Mabi. O Escuro e o Mal sabem que estou aqui, pois foram eles que me deram o medalhão de Agat para voltar pra cá.
A loira riu alto.
- Hahaha. Queridinha, o que a faz pensar que eles a ajudaram, se eles têm interesse no Mago Morto tanto quanto eu?
Cora sorriu de leve.
- E você acha que já não sei de tudo isso? Vim cumprir a função que o criador de Oz me designou. Já sei o que me espera.
Mabi ficou séria.
Eu ainda não sabia o que fazer ou dizer.

Chegou em casa desolado e deprimido como sempre. Estava odiando o trabalho, tanto quanto o fato que tanto tempo havia passado e ainda não sabia ao certo o que queria da vida ou não tinha coragem de assumir sua vocação. Ainda mais agora, com um segundo filho a caminho. Sentiu-se solitário, como em muitas outras noites e teve um desejo intenso de morrer. Como em outras noites. Sentia-se pequeno, sozinho e fraco diante da vida. Fechou-se em seu quarto mais uma vez. Fechou-se em si mesmo e em seu mundo particular mais uma vez. Morreu, mais uma vez. Era a oitava.

Eu caminhava pelo Salão das Memórias, à sua espera. Olhava para cada um dos dez espelhos. Parei diante do nono deles.
- Ótimo. Ele está aqui. Arlequim! – gritei. E o palhaço veio.
- Sim, milórde.
- Vá buscar o Nono Oz. Ele está no cemitério, sobre os dez túmulos. Traga-o aqui.

Mabi fez uns sinais com a mão e o chão começou a criar vida. A terra e as raízes cresceram e subiram pelo corpo de Cora, imobilizando-a. Eu parecia paralisado também. Provavelmente deveria estar dormindo sobre os braços, o que normalmente nos faz ficar imóveis nos sonhos. Apenas achei isso naquela hora.
- Oz! Você tem que fazer alguma coisa! – Cora gritou.
- Eu. Eu não sei... – foi tudo que pude dizer.
- Ele não tem o que fazer aqui, senão olhar o amor de seus sonhos morrer, queridinha. Hehe. – disse Mabi.
- Do... Do que você se lembra, Oz? – esforçou-se Cora para perguntar.
Então eu disse aquilo que achei que nunca diria num sonho:
- Eu... Só consigo lembrar que “pior do que tentar encontrar o amor perfeito em vida, é amar um personagem criado em minha cabeça e que não existe de verdade”.
Não sei porque disse aquilo. Mas Cora e Mabi sabiam. E Cora chorou, enquanto Mabi tirava de algum lugar um enorme espelho que brilhava muito.
- Eu disse, garota. Não há o que um ser mitológico como você possa fazer para salvar um criador alienado. No fim – disse a loira, deixando o caminho livre diante do espelho – tudo não passa de ilusão. Loucura. E disso eu entendo.
Eu tive vontade de chorar. Cora então disse suas últimas palavras para mim.
- Oz, toda história pode ser recontada, reescrita. Eu estou cumprindo meu papel, mas e você? Está cumprindo o seu? - uma lágrima de sangue escorreu de seu olho esquerdo. – Quando eu não estiver mais aqui, vire as costas para o que ficou e caminhe numa nova direção. Veja-se no espelho. Pode parecer absurdo, mas eu te...
E antes que ela terminasse, do espelho brilhante pulou um lobo sanguinário que a fez calar. Ele estraçalhou seu pescoço e pareceu deliciar-se com a morte da bela Cora. Eu estava petrificado, com um medo apavorante daquele canino de olhos vermelhos e fumegantes. O lobo arrancou o colar de Cora com os dentes e saiu andando em direção ao espelho, enquanto todo o sangue e todo o corpo de Cora tornaram-se pó e desapareceram, na primeira brisa que passou. Depois que o lobo se foi, eu consegui me mexer.
- Não achei que seria tão fácil te dominar, pequeno Oz. – disse Mabi. – Você é pura ilusão. Lúcifer estava enganado sobre você...
Pensei que talvez o que Cora havia dito fosse mais literal que metafórico, então me virei de costas para onde ela estava e caminhei até o espelho. Olhei para ele e não me lembro do que vi, mas lembro de sentir-se “revelado”, como alguém que recebe do nada uma grande doze de sabedoria. Lembrei de como havia ficado triste antes de dormir por causa da minha vida, da minha preocupação com a chegada de meu primeiro filho e minha dificuldade em amadurecer para ser um bom pai. Lembrei que senti como se tivesse morrido por dentro e então, eu já era mais do que eu, ali, naquele momento onírico.
- “Ah, doce irmã da dor. Sempre sozinha. Cega você procura pela verdade. Eu me vejo em você. vidas paralelas girando na velocidade da luz pelo tempo.” – eu disse para Mabi.
Ela pareceu surpresa, mas manteve a postura arrogante de sempre.
- Ora, ora. – disse a loira. – Finalmente nosso morto-vivo, “o” Oz de verdade.

O palhaço trouxe o Nono Oz. Era eu. Mas ao mesmo tempo não era.
- Venha. – eu disse. – tenho que lhe dar algumas instruções antes de sua última morte.
- Mas... – disse o nono morto, perplexo. Quem é você? Eu morri? Tô sonhando?
- Eu sou você. Ou melhor, você é uma parte de mim que não existe mais. Reparou como somos parecidos?
E, levando-o ao espelho, ele pode ver como éramos a mesma pessoa.



...é, ainda continua...

postado por The Oz às 03:09 |

sábado, 1 de agosto de 2009

O Mundo de Oz - Tomo II: Delirium - Cap. 4

tanto tempo sem escrever pra fazer um post enorme que me consumiu tempo, sentimentos e sanidade.

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Capítulo 4: Beyond Me

A boneca de pano estranhou o vilarejo japonês em ruínas tanto quanto Mefistófeles, o anjo das Trevas, mas Cora parecia saber exatamente onde estava. E também que estava sem o medalhão de Agat.
- Não acredito! Estamos no Limbo! O medalhão nos tirou do Reino dos Mortos! – animou-se a rainha de Hades.
- Você tem certeza disso? – disse uma voz feminina.
Cora se virou e a viu, vestida de branco como sempre e com seus intermináveis cachos dourados.
- Mabi, a rainha das Ninfas e da ilusão.
- Delírio. – sussurrou Mefistófeles.
- Oi! – disse Mabi, estendendo uma das mãos – E tchau! – disse, abaixando a mão e fazendo com que a visão de seus visitantes ficasse turva e indefinida.
Cora só consegue piscar e ao abrir os olhos, não está mais lá.

Quando abriu os olhos, Cora, o anjo negro e a boneca de pano estavam dentro do palácio esmeralda diminuto, diante do pobre pierrô.
- Mas? Quem são vocês? – indagou o velho em seu pijama quadriculado.
Antes que um dos três tentasse dizer, o Arlequim o fez, surgindo quase do nada, numa das portas.
- São convidados do mestre, meu querido amigo e quase irmão! E ele os aguarda em seu salão.
- Ele está aqui? Mas...
- Veio por um dos espelhos agora a pouco e pediu para que viesse chamar por vocês.
O Arlequim fez sinal para que eles fossem na frente, passando pelas portas e corredores até chegar ao salão principal.
- Charles – disse alguém que estava na janela, à meia-luz - leve a boneca para o cemitério do Escuro. Preciso conversar com Cora e o anjo. E me tragam aquelas coisas que estão na Sala de Ferramentas, ok?
- Sim, senhor! – disse o pierrô, levando a boneca e o Arlequim junto.
- Oz? – perguntou Cora.
Ele virou-se. Não era ele. Era eu.
- Você sabe que sim... e não.
- Confuso como sempre. – foi o que ela disse. – Você ainda me parece o Oz.
- Nós raramente temos uma aparência verdadeira em sonhos – eu disse .– Olha, eu sei por que você está aqui. Mas você sabe?
- Por que você não quer mais acordar e se ver transformado numa barata?
Tudo que pude fazer foi sorrir.
- Preciso que vocês façam algumas coisas por mim. Preencham algumas lacunas e me ajudem a lidar com Mabi, a Ilusão.
- Isso já tá parecendo novela! – disse o Arlequim, que acabava de voltar para a sala com os artefatos que eu pedi. – Música é melhor que novela.
- Nada melhor do que assistir um filminho comendo batata frita! – exclamou Pedrolino, o pierrô.
- Mesmo com todo seu poder dentro de um mundo de sonhos, é um defeito do homem não poder escolher seu destino. Ele pode apenas escolher como reagirá quando o chamado do destino vier. Esperando que terá a coragem para responder a altura. Só descendo ao fundo do poço é que a gente recupera os tesouros da vida. Algumas pessoas morrem e nem ao menos percebem. Eu não só percebo minhas mortes em vida, como não as suporto. Mas algo está diferente. Você está me fazendo ter vontade de viver e melhorar, novamente!
- Você está me dizendo que você criou tudo isso e todas essas mortes só para vir até o Hades? Mas...
- É preciso morrer e renascer, quando a vida que temos já não nos serve mais. – eu disse, estupidamente. – Não é esse o significado do renascimento?
- Eu... – ela hesitou. Sabia. Isso sempre acontece. – Eu pertenço a Hades...
- Ninguém é dono de ninguém.
- Gosto quando você fica meio doido. Parece que é você mesmo. Quando tenta ser certinho fica muito deprê e nada dá certo. Acredite, eu sei como é isso. Mas é mais fácil falar do que fazer! Nós nem pertencemos ao mesmo mundo...
- Eu sempre estive louco, eu sei que eu estive louco, como a maioria de nós... muito duro explicar por que você está louco, até mesmo,se você não está louco... – foi a besteira que saiu da minha boca. – Nem tudo funciona certinho. É preciso quebrar as regras e dar umas pancadinhas de vez em quando... Mas tem que saber onde e como bater. – concluí, pensando em mudar de assunto.
Cora estava pensativa. Medo.
- Eu faço o que tiver que fazer. Já sei qual é meu fim mesmo... Quero te ajudar, mesmo que isso não seja permitido.
Fiquei feliz e angustiado. Sei o que terei que fazer depois... Entreguei-lhes os artefatos. Dei-lhe o colar.
- É um ankh. É um símbolo da vida e do seu ciclo. Um símbolo da ressurreição dos mortos. Ele te trará de volta.
- Boa noite, sonhador. – ela disse.
Pegou as instruções com meus ajudantes, me deu um beijo e foi-se através do espelho. Eu chorei.

Mefistófeles, numa forma humana, aproxima-se do embriagado Oz num bar de Hell City e entrega-lhe o cartão que Cora pediu para que ele o fizesse.
- Aqui. Ele vai entrar em sua mente e retirar de lá o que você precisa.

Mabi, incorporada na princesa vestida de branco de História Sem Fim, disse a Oz que seu mundo seria engolido pelo Nada antes que ele sumisse. Cora não chegou a tempo para interferir. Ela também não conseguiu chegar antes que Mabi se passasse pela versão criança da Princesa e pedir para que ele a amasse quando Oz se deparou com suas dezenas de cópias com defeito. Ma conseguiu puxá-lo do meio de suas cópias e tirá-lo dali a tempo!
- Vem roqueiro maluquinho! Hora de começar sua última saga...
Mais tarde ele tentou saber quem era aquela garotinha branquela, mas ela sabia que não poderia dizer.
- Como você sabe que esses pensamentos insanos estão apenas começando? E como leu meus pensamentos?
- Ah, isso não importa. Não agora. E eu não te salvei. Só você pode se salvar.
- Você sabe de muitas coisas.
- Sei que você tem que aprender a fazer o que quer e ser dono de sua vida. Senão você irá se sentir morto e você pode se recuperar, ressuscitar. Mas não o tempo todo. Você não é eterno como eu! E eu ainda vou te tirar de uma fria de novo! – e empurrou ele por uma das portas do corredor onde estavam.
Ela o salvou de novo, só que ele achou que ela fosse a Morte, outro personagem da ficção.
- Que irônico. Salvo pela Morte.
Ela nada disse sobre isso. Somente o que os palhaços pediram que ela dissesse.
- Você ficou muito tempo esperando que você aparecesse que esqueceu quem era você!
Depois o levou para ver a possível versão mais velha dele sabendo que aquele velho era Mabi. Limitou-se a fazer o que tinha que fazer e dizer ao perdido Oz que somente o presente existia e que ele tinha que parar de perder tempo procurando a si mesmo. E sumiu.
Cora agora estava num hotel escrevendo num espelho: “Aplicai os vossos corações aos vossos caminhos”.
Depois ela já estava presente numa das 9 ressurreições do jovem mago de sonhos. Reconheceu Mabi na pele de uma estranha e sedutora dona de um apartamento simples num bairro afastado, mas nada fez. Cumpriu seu papel colocando o perdido Flávio na frente do Espelho que Pedrolino havia lhe dado para que Oz despertasse e deixou-se ser morta por Lúcifer e seus demônios. Chorou, depois, quando soube que a morte de Mefistófeles não havia sido uma ilusão, pois o anjo havia sido atravessado pelo cedro do Rei dos Demônios, mesmo fingindo ser seu irmão Aladiah.
Ela teve que usar o ankh do mago quando o encontrou num de seus sonhos, num apartamento que ele tirou de uma revista em quadrinhos.
- Você não é o Tim. – ela disse. E também disse: - Enquanto continuar tentando se encaixar numa vida que não é a sua, vai continuar passando por isso...
Cora estava no quarto quando Flávio acordou de sonhos intranqüilos achando que havia se tornado uma barata. Ela não soube na hora porque estava ali. Não havia nada para ela fazer ou dizer naquele momento. Depois, percebeu que ele sabia o que ela estava sentindo e decidiu compartilhar algo muito pessoal com ela.
Ela também pode assistir quando F. foi processado por não ser feliz e ameaçado a ficar confinado numa vida cheia de angústia. Também estava no pequeno e velho cinema assistindo o mesmo filme que F. teve que ver. Foi quando ela descobriu que a sua morte o mudaria para sempre. Mas ela continuou fazendo o que havia prometido e lá estava em outro lugar:
- E às vezes chora por estar perdido e sozinho? – ela disse. – Sonhos só se tornam cinzas se você deixar que os queimem. Ou se você os queimá-los.
Ela estava numa loja, ele olhando um cartaz com a capa do primeiro disco do Black Sabbath, com a mulher vestida de preto na capa. Cora achou que ele a havia reconhecido, mas não era isso. Ela sabia o que era. E pensou por um momento se não deveria aproveitar aquele momento para tirar aquele aperto do coração! Mas ele já havia partido, correndo atrás do velho com o livro “O Homem de Plástico” na mão. Obra de Mabi.
Ela o encontrou novamente numa espécie de clínica psiquiátrica. Ele tentou falar com ela sobre o que havia sentido desde que a viu da outra vez, mas ela desconversou.
- Me sinto estranho quando você está perto...
- Precisa ser você mesmo. Prefiro assim. Tente ouvir a si mesmo, pensar no que você mais gosta de fazer e no que você mais teme.
- Por que você perde tempo comigo?
Ela deu uma resposta evasiva antes de sumir de novo. Chorou por um bom tempo antes de entregar os espelhos para as cinco idades de Oz quando eles se reuniram para que Mordenkai os matassem (ou achasse que o teria feito). Ela já não estava mais empolgada com a idéia de ajudar o mago quando ele a chamou novamente de Morte.
- É só uma palavra... Levante-se. É hora do fim.

Cora não teve tempo de se despedir ou mesmo de ver Oz na caverna de Hades. Estava no cemitério das Trevas, lugar por onde chega e de onde parte. A boneca de pano estava lá, sobre seu túmulo. Estava sangrando. Então veio a luz e ela sabia. Estava partindo da terra dos mortos. Acordou na cama de um hospital, com a mãe aflita ao seu lado, perguntando por que ela fazia aquilo? Ela não se lembrava mais de quem era. Estava viva.

A garota que um dia foi Cora conseguiu viver por algum tempo, mas aos poucos os motivos que a levaram a querer morrer voltaram a assombrá-la e, num dia chuvoso, dentro de seu quarto, ela puxou a Caixa de Coisas Mortas debaixo da cama, pôs no colo e a abriu, sentindo a brisa que a chamava. Chorou por cada coisa que estava lá dentro, por cada lembrança ou sentimento que elas traziam e então tirou a boneca de pano, já bem esfarrapada desde os tempos de adolescente. Foi no banheiro, abriu o armário e pegou alguns remédios. Tomou todos. Deitou-se e dormiu. Acordou sobre seu túmulo gelado no cemitério de Hades. Levantou a cabeça.
- Oi. – disse a boneca, que estava do outro lado, sentada sobre uma das lápides de Oz. Por que você faz isso? Pelo Hades? Pelo garoto? Isso é amor? – perguntou a boneca.
Cora riu.
- De que adianta filosofia aos mortos? – ela disse. – Vamos, preciso do medalhão de Damien para voltar ao Limbo.



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postado por The Oz às 01:56 |